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COMUNICAÇÃO BREVE

Cirurgia de revascularização miocárdica após infarto agudo do miocárdio causado por trombose de aneurisma coronariano

Victor Rodrigues Ribeiro FerreiraI; Valéria B. Braile SternieriII; João Carlos Ferreira LealIII; Luis Ernesto AvanciIV; Achilles Abelaira FilhoV; Mariane SpottiVI; Arthur Soares Souza JuniorVII; Domingo Marcolino BraileVIII

DOI: 10.5935/1678-9741.20110061

RESUMO

A morfologia do aneurisma coronariano configura um fator predisponente para formação de trombos. Porém, a estase sanguínea causada pela alteração do fluxo pode não ser o suficiente para causar fenômenos tromboembólicos.

ABSTRACT

The morphology of coronary aneurysm sets a predisposing factor to thrombus formation. However, the blood stasis caused by the change in flow may not be enough to cause thromboembolic events.

INTRODUÇÃO

Atualmente, os recursos diagnósticos têm sido extensivamente explorados, a fim de se modificar o curso natural das doenças. Mesmo com a crescente disponibilidade da cineangiocoronariografia, o aneurisma coronariano em pacientes jovens tem sido um achado pouco comum. O diagnóstico precoce é fundamental para evitar desfechos indesejáveis. Entretanto, o grande problema é como proceder nos pacientes assintomáticos.

O aneurisma coronariano pode ser definido como uma dilatação focal que exceda em 50% o diâmetro da região coronariana adjacente normal, podendo ainda ser considerado gigante quando a dimensão transversa do vaso supera 2 cm [1]. A prevalência angiográfica dos aneurismas coronarianos varia de 0,15% a 4,9%, dependendo da literatura considerada [2]. As primeiras descrições de aneurismas coronarianos iniciaram-se em 1761, com Morgagni, obviamente baseadas em autopsias. A maioria dos pacientes não apresenta qualquer tipo de sintoma.

A aterosclerose é a causa mais comum, chegando a 50% em dados divulgados na Europa e nos Estados Unidos [2]. Porém, devemos sempre considerar causas relevantes como a Doença de Kawasaki e outras vasculites, como poliarterite nodosa e arterite de Takayasu, doenças autoimunes, doenças infecciosas (incluindo sífilis e doença de Lyme), doenças do tecido conectivo, má formações congênitas, traumas, dissecções e complicações de procedimentos como a angioplastia [3]. Esta última causa tem aumentado na proporção direta do crescimento de sua prática. Atualmente, tem-se discutido a fisiopatologia da formação do aneurisma coronariano após o implante de stents farmacológicos que levam a elevada atividade inflamatória local, seguida de vasculite. Produtos como o sirolimus suprimem a proliferação da musculatura lisa e da neoíntima por um período prolongado. Como alguns fármacos utilizados no revestimento dos stents podem desaparecer em algumas semanas, o processo inflamatório persistente tem sido atribuído ao próprio polímero que estrutura a prótese, bem como o mau posicionamento de seus filamentos [4,5].

Considerando a aterosclerose como a principal causa da formação dos aneurismas, o estudo histológico destes vasos revela deposição de lipídeos na parede do vaso associada a hialinização difusa, calcificação e fibrose focais, levando à ruptura das camadas íntima e média, além de hemorragia intramural [6].

A morfologia do aneurisma coronariano por si só configura um fator predisponente para formação de trombos. Porém, a estase sanguínea causada pela alteração do fluxo pode não ser o suficiente para causar fenômenos tromboembólicos. Logo, a investigação de trombofilias é fundamental, principalmente nos pacientes jovens, já que esta associação diagnóstica influenciará o manejo terapêutico do paciente.

 

RELATO DO CASO

Um caso que ilustra o que está sendo discutido é o de uma paciente do sexo feminino, 24 anos, branca, indidice de massa corpórea (IMC) = 29, que buscou atendimento médico em nosso serviço com queixa de precordialgia tipo constritiva, de forte intensidade, sem fatores de melhora ou piora. O eletrocardiograma realizado na admissão revelava supradesnivelamento do segmento ST em parede ínfero-lateral. Os marcadores isquêmicos séricos revelavam CPK 338 U/l (VR: 145); CKMB 39 U/l (VR: 24); troponina I 3,384 ng/ml (VR: 0,060). A paciente foi submetida a cineangiocoronariografia, que demonstrou coronariopatia obstrutiva por oclusão total da artéria coronária direita com má formação vascular trombosada e imagem sugestiva de dissecção coronariana, sendo realizada angioplastia transluminal percutânea com balão e aspiração de trombo com sucesso parcial (Figura 1).

 

 

O ecocardiograma revelava remodelamento ventricular concêntrico, com assinergia médio-basal ínfero-septal da parede inferior do ventrículo direito, porém com função contrátil preservada.

Cerca de quatro horas após o procedimento, a paciente apresentou novo episódio de dor precordial típica associada à alteração eletrocardiográfica, sendo diagnosticado reinfarto e iniciada administração de cloridrato de tirofibano. A paciente apresentou remissão dos sintomas, evoluindo com melhora. Dois dias depois, a paciente iniciou quadro de parestesia em primeiro e segundo quirodáctilos em região contígua à punção do cateterismo. Foi realizado ecodoppler color arterial do membro superior direito, que revelou obstrução de artéria radial.

Posteriormente, optou-se por realização de angiografia das artérias coronárias por tomografia computadorizada, que revelou obstrução completa do terço proximal da artéria coronária direita, sem placa mural e acentuado aumento do calibre da porção pré-obstrutiva da artéria coronária direita, chegando a apresentar 10 mm em seu diâmetro transverso. A artéria coronária parecia apresentar continuidade com artéria calibrosa, quase que completamente trombosada, que apresentava curso em semicírculo posterior, tendo em sua extremidade distal coleção amorfa de contraste iodado, localizado ântero-superior em relação à veia pulmonar direita, ântero-medial em relação à veia cava inferior e posterior à aorta ascendente na altura do apêndice atrial esquerdo. Esta coleção estava em contiguidade com a parede do átrio esquerdo e apresentava imagem que sugeria comunicação com a veia cava superior através de pequeno trajeto, podendo representar um achado de superposição de imagens. Existia opacificação dos terços médio e distal da artéria coronária direita, inclusive de artéria marginal, provavelmente por colateral.

Dois meses após o evento acima descrito, a paciente foi submetida a nova cineagiocoronariografia via membro superior direito, que revelou má formação de artéria coronária direita, com dilatação tubular importante e obstrução significativa acometendo cerca de 80% da luz do vaso. A paciente evoluiu com dor e parestesia em membro superior direito, sendo realizado ecodoppler colorido arterial, que revelou oclusão em terço distal de artéria braquial por conteúdo homogêneo e hipoecóico, sugestivo de trombo localizado a 4 cm da cicatriz da dissecção do cateterismo. A paciente foi, então, submetida a embolectomia de artéria braquial. Seguiu-se investigação de trombofilias, não apresentando anormalidades nos exames realizados.

Logo, optou-se pelo tratamento cirúrgico, sendo realizada cirurgia de revascularização miocárdica com enxerto venoso aortocoronário direito, com auxílio de circulação extracorpórea. A paciente permaneceu na unidade de terapia intensiva por 48 horas e recebeu alta hospitalar após sete dias de internação. Encontra-se assintomática até hoje e em tratamento com dupla inibição da agregação plaquetária com uso de ácido acetilsalicílico e clopidogrel.

Passados 18 meses da intervenção cirúrgica, a paciente foi submetida a nova angiotomografia coronariana, que revelou segmento proximal de artéria coronária direita aneurismático contendo imagem sugestiva de trombo, com oclusão total da artéria e enxerto vascular de veia safena em segmento distal da artéria coronária direita pérvio e sem lesões (Figura 2).

 

REFERÊNCIAS

1. Nichols L, Lagana S, Parwani A. Coronary artery aneurism: a review and hypothesis regarding etiology. Arch Pathol Lab Med. 2008;132(5):823-8. [MedLine]

2. Syed M, Lesch M. Coronary artery aneurysm: a review. Prog Cardiovasc Dis. 1997;40(1):77-84. [MedLine]

3. Pahlavan PS, Niroomand F. Coronary artery aneurysm: a review. Clin Cardiol. 2006;29(10):439-43. [MedLine]

4. Bavry AA, Chiu JH, Jefferson BK, Karha J, Bhatt DL, Ellis SG, et al. Development of coronary aneurysm after drug-eluting stent implantation. Ann Intern Med. 2007;146(3):230-2. [MedLine]

5. Slota PA, Fischman DL, Savage M, Rake R, Goldberg S. Frequency and outcome of development of coronary artery aneurysm after intracoronary stent placement and angioplasty. STRESS Trial Investigators. Am J Cardiol. 1997;79(8):1104-6. [MedLine]

6. Hawkins JW, Vacek JL, Smith GS. Massive aneurysm of the left main coronary artery. Am Heart J. 1990;119(6):1406-8. [MedLine]

Article receive on domingo, 25 de setembro de 2011

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