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ARTIGO ORIGINAL

Obtenção minimamente invasiva de veia safena para cirurgia de revascularização do miocárdio

Antônio S. Martins; Rubens R. Andrade; Marcos A. Moraes Silva; Reinaldo A. Oliveira; Nelson L. K. L Campos; Ricardo De Mola; Ademar R. Souza; Júlio Vidotto; Carlos Padovani

DOI: 10.1590/S0102-76382004000200009

RESUMO

OBJETIVO: Analisar, comparativamente, a obtenção minimamente invasiva com o uso do MINI-HARVEST® e com instrumental tradicional adaptado. MÉTODO: De junho de 1996 a janeiro de 1999, 63 pacientes submetidos à cirurgia de revascularização do miocárdio tiveram suas veias safenas retiradas segundo técnica minimamente invasiva. Nos 30 primeiros pacientes da série utilizou-se método de visão direta com auxílio de dois afastadores de Langenbeck, e nos 33 restantes utilizou-se o MINI-HARVEST®. RESULTADOS: A idade média dos pacientes era de 61 ± 8,75 anos, sendo 52 homens e 11 mulheres. Quarenta e cinco pacientes eram diabéticos, 45 apresentavam sobrepeso/obesidade, 25 eram tabagistas ativos, 32 apresentavam história pregressa de infarto do miocárdio. O tempo médio de retirada da veia safena com afastadores Langenbeck foi de 34,2 ± 8,14 minutos e com o MINI-HARVEST® de 39,20 ± 9,12 minutos. A extensão de veia retirada foi similar nos dois grupos, variando de 10 a 30 cm. Houve uma deiscência superficial no grupo com afastadores de Langenbeck. Houve necessidade de reversão para método tradicional de retirada em dois casos do grupo MINI-HARVEST® e um do grupo Langenbeck. A incidência de infarto transoperatório foi 4,5% (três) no grupo Langenbeck e 3,1%(dois) no grupo MINI-HARVEST®. CONCLUSÕES: Podemos concluir que o método de obtenção de veia safena minimamente invasivo sob visão direta é efetivo e seguro, tanto com o uso de instrumentos tradicionais adaptados para este fim, como com afastadores especialmente constituídos, ressaltando-se que o MINI-HARVEST® dispensa a presença de um auxiliar.

ABSTRACT

OBJECTIVE: To comparatively analyze minimally invasive procurement of saphenous veins using Mini-Harvest® system and a technique using adapted traditional instruments. METHOD: From June 1996 to January 1999, 63 patients who were submitted to Coronary Artery Bypass Grafting Surgery had their saphenous veins resected using minimally invasive techniques. In the first 30 patients of the series, a direct visualization method employing two Langenbeck's retractors was utilized and for the 33 remaining patients the Mini-Harvest® technique was utilized. RESULTS: The mean age of the patients was 61 ± 8.75 years old. Fifty-two patients were male and 11 female. Forty-five patients were diabetics, 45 were overweight or obese, 25 were smokers and 32 presented history of myocardial infarction. The mean time to resect the saphenous vein using the Langenbeck's retractors was 34.2 ± 8.14 minutes and using the Mini-Harvest® it was 39.20 ± 9.12 minutes. The lenghts of the extracted veins were similar in both groups, varying between 10 and 30 cm. There was one case of superficial dehiscence in the Langenbeck group. With two patients in the Mini-Harvest® group and one in Langenbeck's group it was necessary to revert to the traditional method of procurement. The incidence of tran-soperative infarction was 4.5% (three patients) in Langenbeck's group and 3.1% (two patients) in the Mini-Harvest® group. CONCLUSIONS: We can conclude that the minimally invasive procurement methods of the saphenous vein by direct visualization are effective and safe, both when employing adapted traditional instruments and using purpose-made retractors. We stress, however, that the Mini-Harvest® method does not require an assistant.
INTRODUÇÃO

Cirurgias minimamente invasivas são caracterizadas pelo menor trauma cirúrgico e estão associadas a menores incisões, podendo ser realizadas sob visão direta ou endoscópica [1]. A cirurgia torácica geral também tem se beneficiado de métodos minimamente invasivos [2]. Na cirurgia cardíaca, temos em destaque a revascularização do miocárdio, seja sem o uso de circulação extracorpórea ou com incisões reduzidas. A veia safena ainda é enxerto muito utilizado [3]; assim, métodos minimamente invasivos para sua obtenção são desejáveis, pois diminuem o trauma cirúrgico e resultam em melhor resultado estético. Os métodos que utilizam técnica endoscópica total apresentam vantagens, pois necessitam de uma ou duas pequenas incisões, permitindo a retirada de longos segmentos de veia safena [4]. Contra estes métodos pesam o seu custo e espaço no campo cirúrgico, o que pode retardar o tempo de abertura do tórax. Métodos de obtenção sob visão direta podem ser tão simples como o utilizado por STAVRIDIS [5] ou mais refinados com uso de afastadores especiais [6].

Tivemos por objetivo comparar a obtenção de veia safena por método minimamente invasivo, sob visão direta com uso de afastadores adaptados (Langenbeck) e com afastadores próprios para este procedimento (MINI-HARVEST® - USSC - Cardiothoracic System, Newalk).

MÉTODO

De junho de 1996 a janeiro de 1999, 63 pacientes submetidos à primeira cirurgia eletiva de revascularização do miocárdio tiveram suas veias safenas retiradas por método minimamente invasivo sob visão direta. Nos 30 primeiros pacientes da série, utilizou-se método sob visão direta com auxílio de dois afastadores de Langenbeck. Nos 33 pacientes restantes, utilizou-se método de visão direta com auxílio do afastador apropriado para este procedimento, o MINI-HARVEST®. Os primeiros constituíram o grupo 1 e os demais o grupo 2. Foram avaliados: 1-idade; 2-sexo; 3-tabagismo ativo; 4-sobrepeso/obesidade; 5-presença de infarto prévio; 6-diabetes; 7-tempo de retirada da veia; 8-necessidade de reversão para método tradicional de retirada; 9-infecção e/ou deiscência na sutura; 10-infarto transoperatório e 11-mortalidade.

No grupo 1 (com afastadores de Langenbeck), com auxílio de fonte de luz, iniciou-se a incisão próximo à prega inguinal, sendo a veia safena dissecada e isolada. Realizou-se tunelização subcutânea aproximadamente até 1/3 médio da coxa, onde nova incisão de aproximadamente 3-4cm foi realizada. Após dissecção da veia, nova tunelização foi realizada até próximo ao joelho e assim sucessivamente até atingir a extensão requerida para a operação. Com ajuda de um auxiliar, os afastadores de Langenbeck foram posicionados de modo a permitir a visualização do trajeto venoso subcutâneo (Figura 1A). Os ramos foram ligados com ligaclip Ethicon® LT100.



No grupo 2 seguiu-se a mesma padronização com exceção que não foi necessária a presença de um auxiliar cirúrgico (Figura 1B).

O tempo torácico das cirurgias foi tradicional, isto é, mediante esternotomia, circulação extracorpórea com emprego de solução cardioplégica cristalóide ou sangüínea. Utilizou-se nos pacientes abaixo de 70 anos anastomose de artéria mamária interna esquerda para artéria interventricular anterior. Foram considerados diabéticos aqueles pacientes com diagnóstico firmado e em acompanhamento clínico, fazendo uso de hipoglicemiantes orais ou insulina. Fumante ativo foi considerado todo paciente que não suspendeu a prática do fumo até um mês antes da operação. Paciente com sobrepeso/obeso foi considerado todo paciente com pelo menos 20% acima do peso ideal para idade. Para o diagnóstico de infarto transoperatório consideramos o aparecimento de novas ondas Q e/ou diminuição acentuada de onda R. Neste trabalho consideramos a mortalidade hospitalar. A presente pesquisa foi apreciada e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa local (CEP).

RESULTADOS

A Tabela 1 sumariza os resultados referentes à população estudada, encontrados nos dois grupos.



A Tabela 2 sumariza os resultados referentes ao método utilizado, encontrados nos dois grupos.



COMENTÁRIOS

Com relação à população estudada, encontramos diferença apenas quanto à presença de sobrepeso/obesidade nos pacientes . Este fato pode ser explicado pelo fato dos grupos não terem sido constituídos de modo randomizado. Assim, no início de nossa experiência, empregamos o método minimamente invasivo em pacientes diabéticos e obesos, ou seja, aqueles mais prováveis de evolução com infecção ou deiscência de suturas. Com o ganhar de experiência e o uso do MINI-HARVEST® passamos a utilizar o método também com fins estéticos, porém sempre indicando-o em pacientes com potencial para complicações. Este fato pode explicar a presença um pouco acima da média relatada na literatura de pacientes com sobrepeso e diabéticos [7,8].

Com relação aos resultados obtidos, não houve diferença entre os dois métodos quanto ao tempo de retirada da veia safena. Embora não tenha sido feita comparação com o método tradicional, o tempo requerido por estes métodos para dissecção e retirada da veia é superior ao método tradicional, muito embora tenha havido redução com o progredir da curva de aprendizado. O tempo médio por nós obtido está de acordo com a literatura [5,6]. A extensão da veia safena retirada foi igual nos dois grupos, compatível com uma média de 2,5 enxertos por paciente em cada grupo. Não houve diferenças quanto à necessidade de reversão para o método tradicional. A presença de um auxiliar no grupo 1 facilitou a exposição, porém o MINI-HARVEST® de segunda geração, com angulador, permite excelente exposição da veia dentro do túnel subcutâneo. A maior preocupação com métodos novos refere-se à integridade do enxerto, particularmente de seu endotélio. Alguns autores testaram esta integridade com métodos endoscópicos e com afastadores similares ao MINI-HARVEST®, chegando à conclusão que estes métodos permitem a retirada de enxertos de veia safena com preservação do endotélio [9,10]. Não realizamos este tipo de análise baseando-se somente na incidência de infarto transoperatório e mortalidade; vários fatores estão envolvidos nestas variáveis, tais como técnica de anastomose do enxerto, leito distal coronariano, método de proteção miocárdica e função ventricular. Contudo, é inegável que um enxerto com má preservação ou lesado durante a sua retirada está associado a maior índice de oclusão [11]. Na presente série tivemos um óbito em cada grupo. No grupo 1, o óbito deveu-se a acidente vascular cerebral grave e, no grupo 2, à síndrome de baixo débito pós-operatória. Não houve diferenças nos dois grupos quanto a estas variáveis, estando os valores encontrados em coerência com o relatado na literatura para cirurgias de revascularização com uso de circulação extracorpórea e solução cardioplégica [12].

Não encontramos diferença quanto à incidência de infecção e/ou deiscência de suturas. Houve apenas uma deiscência superficial no grupo 1. Alguns autores [13-15] analisaram a presença de hematomas, edema e dor. Preferimos não fazê-lo, pois tais critérios são por demais subjetivos. Quanto ao aspecto estético, é inegável o melhor resultado de métodos minimamente invasivos (Figura 2). O grau de exigência estética varia de paciente para paciente e com seu nível social e econômico. Assim, não encontramos escore, na literatura, aplicável a nossa população.



CONCLUSÕES

O método de obtenção de veia safena minimamente invasivo sob visão direta é efetivo e seguro, tanto com o uso de instrumentos tradicionais adaptados para este fim, como com afastadores especialmente constituídos, ressaltando-se que o MINI-HARVEST® dispensa a presença de um auxiliar.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Article receive on quarta-feira, 1 de outubro de 2003

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